Política pública uruguaia pró maconha é debatida na Câmara de Porto Alegre
Por William Figueiredo*
Ativistas adeptos a legalização e especialistas
favoráveis à descriminalização da maconha no Brasil debateram o projeto de lei
uruguaia que regulamenta a substância, na quarta-feira, 11 de setembro, na
Câmara de Vereadores de Porto Alegre. O debate teve a participação do advogado
e especialista em Criminologia, Saulo de Carvalho; do especialista de Segurança
Pública e Direitos Humanos Marcos Rolim; do integrante da ONG Viva Rio, Tião
Santos e [ver doutora que estava na mesa];
dos vereadores Fernanda
Melchionna [PSOL] e Alberto Kopittke [PT], proponente do painel e
mediador; além do sociólogo e integrante do movimento Regularización Responsable,
Diego Peres, via chat.
A economía da maconha - Em 2013, a Organização Mundial
da Saúde [OMS] admitiu que o mundo perdeu a guerra contra as drogas. Em 2011,
segundos dados do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas] e do
Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas [CEBRID], apresentados pelo
mediador do painel, 7 milhões de gaúchos, entre 14 e 60 anos, já haviam fumado
cannabis sativa [maconha] uma vez na vida. Destes, 5,5% fumava cannabis pelo
menos uma vez ao mês; 1,9% seis vezes ao mês; e 1,2% consumiam cerca de 20
cigarros de maconha por mês. Cerca de 600 mil, eram usuários regulares de
cannabis.
A economia do narcotráfico no Rio Grande do Sul
girou apenas com a maconha, em 2011, cerca de R$310 milhões. Ou seja, 102
toneladas da droga, com a média de 3 gramas por cigarro, ao custo médio de
R$3,00.
A política da maconha uruguaia - Integrante do
movimento pró-regulamentação da maconha Regulación Responsable, o sociólogo
uruguaio Diego Peres acredita que o processo de regulamentação da cannabis no
Uruguai visa acabar com o tráfico da substância. Segundo Peres, entre 2003 e
2009, 43% das operações policiais envolvendo a maconha, detiveram usuários que
possuíam menos de 10 gramas da erva.
A dificuldade em identificar se o portador de
cannabis é usuário ou traficante é grande. “Muitos consumidores não têm como
demostrar que a posse é para uso pessoal. E não existem critérios que digam
qual a quantidade permitida para uso pessoal”, observa Peres.
Apesar do consumo de maconha ser socialmente aceito
no Uruguai, segundo Diego, a perseguição e criminalização dos usuários
coexistia socialmente. Em 2012, uma uruguaia de 65 anos foi presa por cultivar
cannabis em casa, porém “a opinião pública se deu conta de que essa pessoa não
representava uma ameaça à sociedade, não havendo sentido em mantê-la sobre
custódia”, comenta.
Brasil: a lei anti-lei - Saulo de carvalho,
especialista em Criminologia e advogado, defendeu o debate sobre o tema,
classificando-o “imprescindível e necessário” para a sociedade brasileira. “A
história vai rir da gente”.
Saul comparou os artigos 28 e 33 da lei 11.343/06.
O 28 estabelece penas alternativas para “quem adquirir, guardar, tiver em
depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal” qualquer tipo
de droga ilegal. Porém, na maioria dos casos em que pessoas são flagradas com uma
quantidade pequena de maconha, elas são enquadradas no artigo 33 da lei. Esse
artigo determina pena de cinco a 15 anos – em regime fechado — para quem
“importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender,
expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar,
prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas (ilegais), ainda
que gratuitamente”.
A diferenciação entre enquadrar o usuário no artigo
28 ou no artigo 33 é, inicialmente, responsabilidade do policial. “De acordo
com essa lei, fornecer, ainda que gratuitamente, drogas, tem a mesma pena de
quem importa ou exporta. Quem define se a quantidade e a conduta são para uso
pessoal ou não? É um cheque em branco para a polícia, que definirá em que
artigo enquadrar os sujeitos. Tentem dimensionar o efeito disso na nossa
política de segurança pública”, reflete.
“São jovens e negros que estão morrendo”, critica
Marcos Rolim
Ex-deputado e especialista em Segurança Pública e
Direitos Humanos, Marcos Rolim acredita que o debate sobre a regulamentação da
maconha no Brasil foi “sequestrado pelo discurso criminal”. Para ele, “a
discussão jamais poderia ser objeto exclusivo desse discurso e jamais poderia
ter se afastado dos discursos da saúde, dos direitos civis e das liberdades
individuais”.
Rolim criticou o projeto de lei do deputado federal
Osmar Terra (PMDB), que prevê duras penas para usuários e pequenos traficantes
de drogas. “Não há como sustentar uma política pública com base em uma lei tão
estúpida”, disse. O projeto já aprovado pela Câmara, está tramitando no Senado.
A transformação diária de usuários presos em
traficantes é diária no Brasil. “Enquanto prendemos milhares de usuários e
pequenos traficantes, estamos agenciando condições de formação do crime. A
prisão de pessoas com este perfil é um dos principais fatores organizadores do
crime. Não há opção em um presídio a não ser se integrar a uma facção criminal.
Estamos estimulando o crime todos os dias. Não dá mais para continuar nessa
história”, resalta.
Marcos Rolim destaca que a opinião comum de que “as
drogas são um problema porque matam” não é válida ao retratar a realidade. No
Brasil, “os indicadores de morte, incluindo aqueles pelo uso de crack, que é a
droga mais destrutiva e perigosa, apresentam um número pequeno (de óbitos por
causa de drogas). Quem está morrendo em crimes associados a drogas no país não
são usuários, são traficantes e policiais, em uma guerra civil não declarada
que corre pelas periferias. São jovens e negros que estão morrendo. O tráfico é
um produto do proibicionismo”, afirma.
*Acadêmico de Jornalismo
Ulbra
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